segunda-feira, 19 de fevereiro de 2007

Mais um conto feito a oito mãos


(De Alessandra Bertazzo, Eduardo Borges, Sacerdote e Me Morte)

O BAILE DE MÁSCARAS

Mil novecentos e noventa e um. Carnaval inesquecível aquele. Pau a Pique, interior do Paraná. Muito se falava na pequena e simpática cidadezinha próxima ao litoral do estado, famosa por sua cachaça e pela folia de momo nas ruas, oferecida aos turistas. Fiquei curiosa. Sempre gostei dessa festa “pagã”. Juntei um grupo de amigos, todos pagãos como eu e no sábado de Carnaval lá estávamos nós descendo a serra cheios de vontade de curtir a festa no interior.
Contava-se que além da festa nas ruas, haveria um baile de máscaras no clube local. Era o primeiro baile do tipo realizado na cidade, recém emancipada. Estariam presentes todas as autoridades do município. Ficamos curiosos. Nunca havíamos ido a um baile de máscaras e numa cidade do interior devia ser algo mais curioso ainda. Dois dias antes do baile resolvemos explorar o comércio em busca das fantasias mais inusitadas. Estávamos num grupo de cinco pessoas, três mulheres e dois homens.
Percorremos algumas lojas e depois de quatro longas horas de busca, nos encontramos satisfeitos no hotel, cada um com seu figurino debaixo do braço. Combinamos que só nos veríamos fantasiados na hora de sair para a festa. Havíamos apostado os convites do baile. Aquele que estivesse com a fantasia mais bizarra pagaria os ingressos dos outros.
Estava ansiosa para ver as fantasias dos meus amigos. Por isso, fui a primeira a me vestir para esperá-los na recepção. Estava me sentindo a própria Carmem Miranda com aquelas bananas na cabeça. Eu tinha jurado que ia comprar algo bem confortável, mas, como sempre, fui enrolada pela vendedora. Eu sempre caia na lábia dos outros. Já era conhecida entre meus amigos como "Maria vai com as outras", pois bastava meia dúzia de palavras para que eu comesse até merda se mandassem. O peso daquelas frutas certamente era pior que qualquer enxaqueca. Senti-me uma verdadeira salada de frutas ambulante. Além das bananas, havia abacaxis, pêssegos, laranjas e mais as maçãs, tudo natural. Mas o que mais se destacava em mim era o cheiro do abacaxi, que estava forte. E a minha maquiagem de colombina. Nunca me senti tão ridícula na vida. Pensando bem agora, será que eu agüentaria passar a noite toda com aquele peso na cabeça? Já estava me arrependendo de ter feito a aposta, quando eles apareceram, já rindo da minha cara assim que entraram no saguão.
__Que merda! Maldita hora que fiz essa aposta. To me sentindo ridícula – esbravejei irritada.
__Ha, ha, ha, ha... que é isso agora? Pirou? A idéia é se sentir ridículo. Lembra? E a propósito, é você quem vai pagar os ingressos. Sua fantasia foi eleita a vencedora, não é pessoal? – instigou o Tomate, o mais “mala” do grupo. Todos concordaram.
__Ora, ora... pense pelo lado bom: se a gente ficar com fome, atacamos sua cabeça! Ha, ha, ha, ha... – exclamou a Siamesa, a mais atirada da galera.
__Tá bom, tá bom. Eu pago. Mas não tá na hora ainda. Temos meia hora. Vamos até o bar tomar uma cachaça para eu me animar.
Todos riam de mim. Eu merecia. Como fui burra. Tinha tantas fantasias... Odalisca, cigana, até enfermeira era melhor que isso... Meus olhos estavam cheios de lágrimas de tanta vergonha. Mas não ia deixar que eles percebessem. Na ânsia de esquecer minhas lástimas, depois de uns três copos de cachaça, já me sentindo um pouco mais animada e aérea, me levantei para ir até o banheiro. Enquanto me encaminhava para lá, um funcionário me abordou, dizendo que estava com “fome” e que me ofereceria uma taça de vinho doce, sanguíneo e inebriante para combinar com as frutas. "Cortesia da casa", disse e sorriu, lançando-me um olhar malicioso. "Pronta para o baile de hoje à noite?", perguntou-me após alguns segundos. Levantei os olhos e, provavelmente por influência da uva fermentada, esbarrei em um sorriso maravilhosamente sedutor. "Sim, hic, acho que agora estou. Desculpe” – respondi, sem me importar com aquele soluço involuntário que escapou dos meus lábios. "É... acho que está mesmo”, segredou ele ao meu ouvido, o cheiro de seu hálito mais parecendo uma brisa marinha. “Mas acho que tenho a fantasia perfeita para você”.
Perfeito ou não, aquele comentário malicioso sobre a fantasia, muito me agradou. Fosse como fosse, após cinco anos de separação, aquela era a primeira vez que um homem demonstrava interesse por mim. A bem da verdade, não passava de um sujeito boçal, mas isso não fazia diferença, quando o intuito era despertar algo que, já há muito, havia desfalecido. Constrangida e ao mesmo tempo excitada,
deixei que ele pousasse suas mãos grossas e firmes em minha cintura e seguimos para o jardim. Ele fugia do trabalho, e eu, de minhas inóspitas carências.
No estado ligeiramente alterado em que me encontrava, um ser grosso e vulgar até que ia bem. Uma de minhas fantasias prediletas sempre fora com os peões de Barretos. Aquele cheiro de cavalo, de touro enfurecido, a barba por fazer, os músculos... nossa! Era tudo o que eu precisava naquela hora, já sentindo a umidade libertina entre minhas pernas. Em meio a rosas e cactos, nos amarfanhamos naquele parco jardim do Éden. Ele cheirava a suor e gordura e eu exalava o cheiro do abacaxi. Realmente, eu estava precisando mesmo daquilo, de um homem de verdade, másculo, forte, dominador. Estava cansada de falsas promessas de virilidade, meu ex-marido deixara muito a desejar em termos de masculinidade. Queria ser amada vulgarmente ali naquele local, no meio daquele povo interiorano, sem maiores delongas, ser penetrada com fúria e avidez de animal no cio. Afinal era Carnaval, portanto só havia lugar para o prazer, para a satisfação da luxúria, do desejo, dos instintos.
Naquela hora esqueci tudo. Amigos, baile, fantasia. Nada mais me importava. Não fosse minha fome de sexo, passaria despercebido. Os dedos dele trabalhavam com extrema perícia e destreza. Era um. Eram dois. Eram três... na frente, atrás, entrando, saindo, voltando. Hum... humm... hummm... ai... uiii... Aquilo estava me deixando doida. Não agüentava mais de tanto tesão e não via a hora da posse completa, irrestrita e animal, ali no meio daquela festa pagã. Esperava ansiosa pelo momento em que ele substituísse seus dedos tão ágeis e experientes pelo membro duro e viril feito rocha, quando subitamente ele parou tudo e me deixando na mais completa excitação, disse um tanto estranho:
___Preciso te falar uma coisa.
___Agora??? Não pode ser depois? – indaguei contrariada, deslizando minhas mãos em seu peito cabeludo.
___Agora. Tenho que dizer logo antes que... Sou gay.
___O que você disse?
___GAY... Sou GAY!!!
___Gay??? Que palhaçada é essa agora? Você só pode tá brincando...
___Não linda... sou gay. E com muito orgulho. Há trinta anos.
___Mas por quê?
___Porque gosto de homem... Gosto de um corpo másculo e viril me alisando à noite, me dando prazer, me fazendo feliz.
___Não. Definitivamente estou no meu inferno astral. Cacete! Por que me trouxe aqui, então?
___Por que adorei sua fantasia de Carmem Miranda... Queria para mim. Pensei que se te proporcionasse alguns momentos de felicidade, talvez você pudesse me dar a fantasia em agradecimento. Quero usá-la para realizar uma tara do meu bofe.
Fiquei muda. Nunca pensei que passaria por isso um dia. Meus amigos já deviam estar à minha procura, preocupados com meu sumiço repentino. Além disso, ainda havia o baile. Sem pensar direito, no calor da minha excitação gritei, implorei:
___ Rápido, as bananas. Use as bananas. Amanhã passo aqui de novo e te dou a fantasia.



(Respeite os direitos autorais)

Um comentário:

Giovani Iemini disse...

Hehehe, tenho certeza que a idéia das bananas foi coisa da Me.